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The Last of Us Part 3 - Vol. 26 - Decisão

  • Foto do escritor: Kevin de Almeida
    Kevin de Almeida
  • 7 de abr. de 2022
  • 26 min de leitura



THE LAST OF US

PARTE III

FANFIC


AVISOS E DIREITOS AUTORAIS


Esta é uma obra feita por fã e sem fins lucrativos.

Todos os direitos da marca THE LAST OF US são pertencentes à Naughty Dog.

Qualquer um pode ler esta obra de forma gratuita. Porém a detenção dos textos para divulgação desta fanfic é de única e exclusiva autoria do Autor (Kevin de Almeida Barbosa) nas seguintes plataformas:


https://www.wattpad.com/user/KevindeAlmeida94


https://kbarbosa102.wixsite.com/kevindealmeida


Qualquer um que disponibilizar os textos em plataformas físicas ou digitais, assim como divulgar o conteúdo em qualquer forma, seja via vídeo, áudio ou imagem, estará violando os direitos autorais e estará sujeito às penalidades.

Se é de seu interesse publicar a obra em seu site, conar sua história em canal de youtube, podcast ou outro meio que ignore as plataformas oficiais, favor entrar em contato no e-mail ou instagram para seguir as devidas instruções:


escritorkevindealmeida@gmail.com


@thelastofus.part3


Esta obra levou dois anos para ficar pronta. Muito tempo, trabalho, esforço, estudos e gastos (revisão, edição, capa, divulgação) foram investidos para que pudesse chegar até você de forma gratuita.

Peço que respeitem o trabalho, NÃO divulguem de forma irregular e incentivem esta iniciativa.

Se gostou do trabalho e quer ajudar em sua continuidade, divulgue os links das plataformas oficiais, comente e engaje nas redes sociais e plataformas oficiais, indique para algum(a) amigo(a) que gostará da leitura ou entre em contato no e-mail:


escritorkevindealmeida@gmail.com


Comentários tóxicos, xingamentos e palavras de baixo calão usadas com cunho ofensivo não serão tolerados. A obra tem como intuito entreter, divertir e aproximar os amantes de THE LAST OF US.

Está é uma obra de ficção. Os fatos aqui narrados são produtos da imaginação. Qualquer semelhança com nomes, pessoas, locais, fatos e situações do cotidiano deve ser considerada mera coincidência

Agradeço a compreensão e respeito de todos e desejo uma excelente leitura.



Autor: Kevin de Almeida Barbosa — Instagram: @escritorkevindealmeida ; @thelastofus.part3

Capa: Rafael Cardoso — Instagram: @r.c.dossantos

Revisão: Beatriz CastroInstagram: @beatrizcastrobooks


PS- Infelizmente estou DESEMPREGADO. Quer ajudar/incentivar o desenvolvimento desta obra? Faça um pix de qualquer valor pro e-mail escritorkevindealmeida@gmail.com e já me ajudará muito a manter este projeto em andamento. Obrigado de coração e boa leitura!






!!!LEIAM ANTES DO CAPÍTULO!!!


E aí galera, como estão vocês? Espero que todos bem. Hoje eu gostaria de dar uma palavrinha com vocês e ficaria muito feliz se realmente lerem com atenção.

Primeiro quero agradecer vocês que me acompanham desde o primeiro capítulo até agora. Fico realmente muito feliz com o reconhecimento e com o apoio de vocês. Escrever TLOU 3 não foi facil, é muuuito trabalhoso continuar duas obras primas com tamanha excelência. Eu tive que, não só jogar, mas assistir e reescrever os roteiros dos dois primeiros jogos para entender melhor os personagens, a construção de enredo, os picos em momentos de adrenalina, combate e o mais dificil, o psicológico. Entender a fundo os personagens em sua essência, como pensam, como se sentem, quais suas dificuldades, objetivos e por fim, jornada que deveriam fazer nessa continuação. Foi realmente muito trabalhoso dar continuidade a uma história e personagens já existentes, mas eu sozinho, fiz o meu melhor para que ficasse o mais próximo possível do que a Naughty Dog e o Neil Druckman sabem fazer.

Sendo assim, agradeço o voto de confiança e por me acompanharem e ajudarem em toda essa jornada s2Portanto, chegamos a um ponto delicado. O final. Já é sabido que os finais de the last of us 1 e 2 dividiram muitas opiniões. Ambos terminando de forma bem aberta e com situações controvérsas que muitos amaram e muitos odiaram. A questão é que o jogo não se preocupa se o final vai agradar ou não, ele toma como base os acontecimentos da história e a personalidade dos personagens para chegar no final da história deles, seja um final feliz ou triste.O que quero dizer com tudo isso é que é uma responsabilidade ainda maior, eu, sozinho, querer criar um final a altura de the last of us sendo que o próprio Neil Druckman recebeu milhares de críticas com seus finais. Querer terminar uma obra prima dessas é realmente uma tarefa complicadíssima. Ainda mais pelo fato que The Last of Us não foi feito para agradar os fãs, mas sim, para contar uma história de pessoas, não heróis da justiça e da paz, mas... Pessoas.

Pois assim, depois de muuuuuito tempo pensando num final, e estudando os finais anteriores, eu cheguei na minha própria visão de como terminar tudo isso.Então, gostaria de pedir compreensão de todos vocês, pois não farei um final nutela onde todo mundo fica feliz e tudo dá certo e eba que felicidade haha até porque eu estaria desrespeitando a ideia principal da obra e sairia completamente da vibe que TLOU trás. Eu, como fã assíduo dessa série, preciso respeitar suas origens e fazer um final que condiz com a obra.Sei que haverão aqueles que vão amar e haverão aqueles que vão odiar haha normal. Só peço que tenham respeito nos comentários, comigo e com toda a obra, pois, não é porque você não gosta do final que invalida todo o resto da obra. É hipocrisia ler toda semana atento esperando pelo próximo capítulo e por não gostar do final falar que a obra é uma bosta e não vale apena ser lida.

Falo isso porque tá sendo uma experiencia incrivel e ao mesmo tempo bem difícil, escrever The Last of Us 3. Tenho muitos gastos financeiros, muito tempo escrevendo, revisando, imaginando e quebrando a cabeça pra fazer algo de graça pra pessoas que amam tanto essa série quanto eu. Eu ficaria muito triste se alguém que leu minha obra inteira acabasse não indicando para um amigo porque o final lhe desagradou. Muito pelo contrário, espero que voces compartilhem a obra pra incentivar e mostrar que, nós brasileiros, também somos capazes de fazer histórias incríveis de games.

Bom, é isso hehe Gostaria de contar um pouco mais como está sendo toda essa experiencia, mas vocês já devem estar ansiosos pelo capítulo, né haha

Então bora pro capítulo e boa leitura a todos!

PS- só lembrando que esse capítulo não é o final, tá. Haverão mais dois capítulos depois desse =D








DECISÃO



Dois dias após a grande explosão em Jackson, os sobreviventes se refugiavam em uma das casas que sobraram no lado Norte da cidade. Jackson ainda não era segura. Apesar de todos os Cascavéis provavelmente estarem mortos, ainda havia centenas de infectados habitando o lado sul depois dos destroços.

Silêncio e patrulhas eram necessários para garantir a segurança dos poucos habitantes que restaram da enorme tragédia que se deu. A maioria deles ainda estavam bem machucados, desnutridos e desmotivados. Precisavam decidir se lutariam para retomar a cidade ou se a abandonariam em busca de um novo lar, já que a retomada de Jackson, no momento, parecia impossível. Contudo, nenhuma decisão importante foi tomada nesses dois dias, apenas se preocuparam em descansar, absorver o luto e se recompor aos poucos.

Estavam num lugar estratégico bem próximo ao portão Norte, caso sofressem um ataque de infectados do lado Sul da cidade, poderiam fugir sem muitos problemas e prender os mortos vivos dentro das muralhas.

Todos residiam em uma casa robusta e espaçosa. Os donos da residência foram mortos por Víbora em seu interrogatório pela Besta Ruiva. Vários colchões, travesseiros e cobertores estavam espalhados pela sala, corredores e quartos. Os sobreviventes estavam dispersos, uns sentados no sofá olhando para o vazio, outros em quinas escuras do ambiente, e muitos ainda choravam lamentando seus amados falecidos.

Boa parte deles estava com um prato de comida na mão por conta do almoço comunitário na cozinha. Um ensopado encorpado dentro de uma panela gigantesca, frutas e água em cima da mesa para uma possível sobremesa. Todos já haviam pego seus pratos e alguns até repetido, menos uma pessoa que estava esperando a cozinha estar vazia para poder adentrá-la.

Ellie estava com uma calça de moletom cinza e uma camiseta verde escuro estampada “Lives go on” em letras garrafais, ambas largas por serem roupas emprestadas. Na verdade, todos estavam com roupas emprestadas, pois tinham usado a mesma roupa suja há dias e a maioria perdeu suas casas e pertences.


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Ao entrar na cozinha, Ellie observou a gororoba por alguns segundos, apática. Enfim, pegou uma concha e colocou no prato com dificuldade. Um dos seus braços estava totalmente imobilizado por uma tipoia, e o movimento do outro braço, o mínimo que fosse, já era suficiente para sentir apontadas agudas de dor. Além disso, mancava notoriamente. Equilibrou seu prato com sopa e virou-se vagarosamente em busca de um local isolado para se sentar, mas antes que o achasse, sentiu um encontrão em seu braço com tipoia, fazendo-a grunhir dolorida e derrubar seu prato de sopa.

— Ei! — advertiu Ellie desgostosa.

— É sua culpa! É tudo sua culpa — respondeu uma mulher de cabelos loiros, bem abatida e com grandes olheiras.

Ellie ficou a encarando em silêncio. Os olhos da mulher marejados de lágrimas a encaravam com uma energia que conhecia bem. Era um olhar de alguém que queria matar... Se vingar. Alguns dos sobreviventes reparavam curiosos para cozinha enquanto uma outra mulher se levantou e se dirigiu ao local.

— Eles morreram por sua culpa! Essa cidade padeceu por sua culpa! — continuou com voz trêmula, não dando para identificar se era de tristeza ou de ódio.

— Já chega Amanda, isso não ajuda em nada. — Maria chegou se opondo entre as duas e tentando afastar Amanda que trucidava Ellie com uma expressão rancorosa.

— O lugar dela não é aqui! — Cuspiu no chão aos pés de Ellie.

— Pronto, agora já deu, vai dar uma volta pra se acalmar, Amanda. — Maria a empurrou para a sala e Amanda se afastou ainda encarando Ellie. Maria encheu de sopa um novo prato.

— Obrigada Maria... Por... Por tudo. Por acolher a gente e... — disse Ellie cabisbaixa.

— Não faço por você. Faço em memória do Tommy. — Maria entregou o prato de sopa para Ellie sem a olhar nos olhos, virou de costas e a deixou.

Ellie ficou ali parada, segurando o prato, sua mente vagando em milhões de pensamentos deprimentes enquanto era observada por todos como se fosse algo repugnante e odioso.

Virou as costas e caminhou até a porta do porão, a abriu e começou a descer as escadas. Aquele momento lhe trouxe uma terrível lembrança do dia em que desceu escadas parecidas e encontrou Joel vivo, ou quase, pela última vez. E Abby estava lá, tirando seu bem mais precioso, porém naquele momento a situação era um pouco contrária. Ellie parou em frente a porta, respirou fundo e então a abriu.


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Era um pequeno cômodo escuro, sem janelas, iluminado por uma única lâmpada incandescente que deixava o ambiente em um tom amarelado e sombrio. Um tapete de crochê verde escuro bem surrado e gasto estava ao centro, alguns móveis de madeira envelhecidos e empoeirados nos cantos e era tudo que dava para enxergar já que a lâmpada revelava apenas o centro deixando as beiradas envoltas em trevas.

Abby estava encostada na parede de tijolos, de braços cruzados, encarando um canto escuro da sala. Era perceptível que estava ali só de corpo enquanto sua mente jazia perdida em algum confim infinito do espaço-tempo. Estava com as mesmas roupas de dois dias antes, manchada de sangue, fedendo a suor e alguns ferimentos ainda à mostra.

— Oi... — falou Ellie sem jeito — Trouxe sopa. Não está com uma cara muito boa, mas... — olhou para uma mesa onde havia outros dois pratos de comida fria acumulando insetos. — Você precisa comer...

Abby continuou estática como se não a escutasse. O silêncio era intenso e mórbido quebrado apenas por uma fraca respiração gargarejante.

— Podia pelo menos cuidar de seus ferimentos... — insistiu Ellie, mas Abby permanecia imersa em sua mente, como se estivesse em transe. — Olha, eu sinto muito, de verdade, mas ele...

— NÃO! — ordenou Abby com firmeza. Ellie a olhava com tristeza e amargura, respirou lentamente algumas vezes, e então tentou de novo:

— Maria e os outros estão pensando em partir de Jackson amanhã. — Pausou parecendo processar seus sentimentos, tentou repetir seu costumeiro tique de mexer em seus dedos, porém encontrou apenas gazes do curativo em sua mão dilacerada. — Eles disseram que você pode ir com eles, se quiser. — Desviou o olhar, forçou os lábios, resistiu por um momento e cedeu. — Eu... acho que vou voltar pra Dina... se você quiser, pode vir também, pra rever Tália.

Abby, como uma gárgula, estava ancorada com o ombro na parede e braços cruzados, nem sequer piscava.

— Bom... pensa nisso. É melhor do que você ficar sozinha.


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— É melhor...? — Abby levantou os ombros. — O que você sabe sobre o que é melhor? — Abby se virou para Ellie que a encarava quieta — Ficar com você?! A garota que é um câncer na vida das pessoas. Todo mundo que perto de você morre ou é infectado. Até as pessoas que querem te ajudar acabam morrendo por sua causa!

Abby se exaltou e pegou Ellie pelo colarinho. Normalmente, Abby tiraria Ellie do chão com facilidade, mas, naquele momento, Ellie mal ficou nas pontas dos pés. Sua antiga rival estava um pouco mais magra, desnutrida, com grandes olheiras e traços de sujeira escorridas no rosto pelas lágrimas antes derramadas.

— Tudo acaba envolvendo você, né? A “garota imune”. “A cura”. UMA OVA! — Abby bateu Ellie com força contra a parede.

Um vulto se moveu ao lado delas, correntes tilintaram e um grunhido se tornando um grito alto e abafado estalou a centímetros de seus ouvidos. Lev havia saído da parte escura do porão e tentara agarrar as duas. Estava com grandes correntes, uma ponta amarrada em cada pulso e uma pregada na parede. Tinha uma marca de mordida no joelho que já se transformara em pequenos cogumelos. Suas roupas ainda rasgadas e manchadas de sangue. Sua pele com vários arranhões, hematomas e veias roxas saltadas. Gritava frenético mesmo tendo um pano como mordaça o impedindo de morder alguém. Tentava alcançar Abby desesperadamente, com seu rosto começando a mofar, pupilas brancas e resto do olho avermelhado.

— TODOS QUE EU AMEI UM DIA FORAM MORTOS POR VOÇÊ OU ALGUÉM RELACIONADO A VOCÊ! UMA PUTA QUE SÓ LEVA DESGRAÇA POR ONDE PASSA! — berrava Abby enquanto Lev ainda tentava alcançá-las.

Por um momento, Abby e Ellie ficaram ali, uma encarando a outra com Lev grunhindo insanamente. Abby apertando os dentes à mostra numa mordida raivosa, sobrancelhas forçadas, rosto avermelhado espremendo lágrimas. Ellie com olhos tristes e rosto flácido como se o emocional pesasse em sua pele a deixando caída e sem vida.

— Calma, calma, Lev. Ela não vai te machucar. Ninguém mais vai te machucar. — Soltou o colarinho de Ellie e tornou para o garoto zumbificado. — Cuidado, Lev, seus punhos, se acalma... — O garoto tentava alcançar Abby com tanta força que seus punhos começavam a se rasgar pelas correntes. — Eu aqui com você, Lev. Não vou te deixar pra trás, ? — Abby abraçou Lev com força, prendendo os braços dele e o forçando a se ajoelhar junto a ela. O garoto tentou abocanhar o pescoço dela, mas sua mordaça o impedia de consumir a carne. — Por favor, se acalma, você se machucando... Lev, por favor!


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Ellie já tinha visto muitas cenas traumatizantes, contudo essa engatilhou uma dor emocional interna que jamais imaginou que poderia sentir. Como um buraco negro no estômago que sugava todo sentimento bom que algum dia já existiu dentro de si, como se jamais pudesse ser feliz novamente.

Aquela imagem ficou gravada na mente de Ellie como uma pintura gótica que a atormentaria até seu último suspiro. Abby ajoelhada e chorando enquanto abraçava Lev infectado que a tentava comer

Ellie saiu do porão às pressas, bateu a porta e escorregou suas costas por ela até conseguir abraçar seus joelhos e desabar em lágrimas e soluços. Perguntava-se o porquê de existir em um mundo onde a crueldade era habitual e a felicidade uma mera ilusão passageira e longínqua. Apertava seu joelho com as pontas dos dedos arranhando sua pele através da calça num ato irracional desesperado de expelir essa sensação horrível e destrutiva de dentro de si. E ali, por longos minutos, só se escutava o choro de duas garotas que sobreviveram e os lamentos irracionais de um garoto que não.




Algumas horas se passaram, o Sol se preparava para dar lugar à calada da noite. Ellie estava em uma sacada de uma casa vazia, pois não queria permanecer no mesmo lugar dos sobreviventes. Olhava para as casas sem propósito, como se apenas passasse o tempo enquanto sua alma se afogava vagarosamente.

— INTRUSOS! — gritou um rapaz que corria em direção à casa dos sobreviventes, dois quarteirões à frente.

Ellie se prontificou, e mesmo maneta, com uma perna manca e sem condições de lutar, se apressou em chegar à entrada Norte das muralhas de Jackson. Lá, subiu algumas escadas para enxergar os intrusos de cima. Eram militares, cerca de uns trinta deles, todos bem armados e aglomerados em frente ao portão Norte. Ellie reparava em seus uniformes e sentia que algo não lhe era estranho. Pouquíssimo tempo depois, Maria chegou junto a mais três sobreviventes armados. Passaram por Ellie sem sequer olhar para ela e encararam os intrusos.


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— Quem são vocês e o que querem? — gritou Maria a eles.

— Somos Vagalumes! Queremos conversar — berrou uma voz feminina.

“Vagalumes?!” A mente de Ellie estourou. Será que era verdade? E se fosse, o que estariam fazendo ali? O que queriam?

— O que Vagalumes estariam fazendo em Jackson? — questionou um sobrevivente de cavanhaque. — Deve ser uma armadilha.

— Não! — interrompeu Ellie ao se dar conta do que lhe era familiar no uniforme deles. — Os pingentes de Vagalumes. Olha! Todos estão usando um no pescoço. Eu e Joel costumávamos colecionar esses pingentes.

Maria lhe encarou desconfiada, mas averiguou os pingentes e pareceu comprar o argumento. Então continuou:

— Como nos encontraram?

— Outra Vagalume, Abby, nos passou as coordenadas. Ela me salvou no ataque da Floresta Negra e pediu para que trouxesse os Vagalumes para cá. Achamos uma de suas bases a alguns quilômetros. Estávamos descansando da viagem quando recebemos um S.O.S. vindo daqui.

Na hora, Ellie se ligou sobre o que era e disse a Maria:

— É verdade. Dois dias atrás eu mandei um S.O.S., e foi respondido.

— Eles falaram que eram Vagalumes? — questionou Maria.

— Não deu tempo. As coisas se complicaram antes disso — concluiu Ellie. Maria ficou olhando para eles, pensativa, e depois de um momento, gritou aos Vagalumes:

— Apenas dois de vocês se aproximem dos portões, desarmados. O resto se afaste 20 metros. Nós faremos o mesmo.

E assim, uma garota e um homem ficaram próximos ao portão, o restante dos militares se afastaram, porém, ainda com suas armas em mãos, prontas para serem usadas.

Maria, Ellie e o homem de cavanhaque desceram as escadas até o portão. Maria fez um sinal para que Ellie esperasse, o que ela claramente ignorou. Em seguida, mandou o homem segurar Ellie, porém ela deu uma cabeçada nele e disse que se Maria quisesse a impedir de falar com os Vagalumes, teria que atirar em sua cabeça. Sem opções, Maria concordou cansada e ela e Ellie atravessaram o portão recém-aberto.


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Quando se aproximaram, avistaram uma garota com cabelo cor de vinho e um soldado moreno e musculoso com um colete de guerra. Os quatro ficaram um instante em silêncio se encarando, como se analisassem uns aos outros conferindo se estavam mesmo desarmados. Ellie levantou os braços sem paciência e perguntou se queriam revistá-la.

— Não vai ser preciso. Viemos em um ato de paz, e paz começa com confiança. Prazer, sou Marry — disse a garota que vestia uma calça militar azul escura e uma jaqueta de zíper.

Esticou a mão como cumprimento, mas Maria, de braços cruzados, respondeu:

— Maria. O que querem por aqui, Marry? — Os olhos cerrados, parecia ter o triplo de desconfiança em desconhecidos após todo o ocorrido com os Cascavéis.

— Queremos reestabelecer um mundo de paz, sem infectados — continuou Marry.

— Eu conheço esse papinho. O que realmente querem? — retorquiu Maria.

— Viemos atrás da garota imune. Acreditamos que podemos produzir uma vacina contra o Cordyceps — disse de atravessado o soldado musculoso que recebeu um olhar de advertência de Marry.

O coração de Ellie parou de bater naquele momento. Flashs estranhos de um hospital, médicos com jalecos e sons de tiros invadiram sua mente de forma desconexa.

— E como pretendem fazer isso? — Ellie tomou a frente, tinha uma excitação misturada a uma fria e sufocante ansiedade no peito.

— Bem... conhecemos um neurologista. Ele acredita ter as anotações necessárias para concluir a vacina.

— Cadê ele? — perguntou Ellie instantaneamente. — Ele aqui? — Marry e seu companheiro se olharam. — , não é? Chama ele aqui. Eu sou a garota imune. — Maria arregalou os olhos como se admitisse que Ellie havia revelado demais, mas a garota não quis nem saber. — Chama a porra do doutor aqui. Agora!


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Marry hesitou por um momento, mas fez um sinal com a mão e um homem baixo e de olhos puxados disfarçados por óculos redondos se aproximou deles com uma corridinha desengonçada.

— Este é o Doutor Yudi, o homem que diz ser capaz de produzir uma vacina.

— Mu... muito prazer. — Fez uma reverência baixando levemente a cabeça, meio acanhado. Tinha cabelos curtos e roupas militares que claramente não combinavam com ele.

Marry mostrou o Doutor com uma das mãos e em seguida apontou para Ellie:

— E essa, Doutor, é a garota imune.

Os olhos do doutor Yudi se arregalaram e ele se desequilibrou de leve. A fitou de cima a baixo e demonstrou preocupação ao ver o estado deplorável que a garota se encontrava.

— Vo... você é a garota imune? — perguntou ansioso e Ellie concordou com a cabeça, encarando-o como se não acreditasse que aquele pequeno e indefeso homem poderia mudar todo o rumo da humanidade. — Não acredito. Que honra! É um prazer enorme te conhecer! — Pegou a mão boa de Ellie, a balançava e fazia reverências com o tronco diversas vezes. — Que maravilhoso poder finalmente te conhecer.

Ellie ficou o observando por um instante e todos se entreolharam esperando qual seria a próxima interação. Sem rodeios, Ellie disparou.

— Você é capaz de produzir uma cura?

Todos ansiavam pela resposta do Doutor

— Estamos bem positivos quanto às chances. Tenho algumas anotações de Jerry, o homem que ia fazer a operação da primeira vez. — Todos ficaram claramente desconfortáveis com esse comentário, principalmente Ellie. Lembrar do massacre que Joel fez aos Vagalumes impedindo a cura era um assunto muito delicado até os dias de hoje. Yudi percebeu o climão e tentou continuar. — Er... conseguimos recuperar outros exames feitos contigo no passado também. Muitos homens e mulheres bons deram suas vidas na missão ao hospital, mas não será em vão. Com as anotações e comparando os exames antigos com os novos que va...


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— Dá ou não dá pra fazer a cura? — Ellie o interrompeu impaciente. A ansiedade em seu peito forçava como se seus pulmões fossem explodir.

— Sim! A ciência não é exata, claro, mas as chances são bem promissoras.

— Qual a porcentagem de sucesso? — continuou insegura, porém ainda assim firme.

O doutor hesitou por um momento e respondeu:

— Por volta dos 70%.

Todos encararam Ellie imediatamente, que baixou a cabeça e ficou calada alguns segundos.

— Desculpe, garota, mas tenho que ser sincero com você. Afinal, é da sua vida que estamos falando. — Doutor Yudi recebeu olhares fulminantes de reprovação de Maria, Marry e o outro Vagalume, contudo, não se abalou e continuou: — É uma decisão que só pode ser tomada por você, Ellie. Mas gostaria que pensasse no bem que faria ao m...

— E os infectados? — Ellie interrompeu novamente. — Tem alguma chance de trazer eles ao normal?

— Hum... Esse seria o próximo passo. Primeiro precisamos focar nossos esforços em prevenir a contaminação, depois em algum processo de regressão ou eliminação do fungo nos infectados. — O rosto de Yudi mudou, parecia menos esperançoso e mais sério.

— Mas tem como? — insistiu Ellie.

— Creio que infecções mais avançadas não haja o que fazer. Agora, recém-infectados devem ter chances maiores de reabilitação.

— Reabilitação? — perguntou Maria cruzando os braços.

— Sim. Como o fungo se instala no cérebro, é inevitável que o paciente tenha sequelas.

— Que tipos de sequela? — A voz de Ellie estremeceu.

— Não dá pra saber. O fungo vai em direção ao cerebelo para controlar as funções motoras do infectado. Contudo, até chegar ao cerebelo ele pode passar por qualquer outro lugar.


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Todos ficaram olhando para Yudi como se esperassem mais explicações.

— Traduz pra gente, Doutor. — pediu Marry.

— Bem... pode ter perda completa ou parcial dos movimentos corpóreos, perdas cognitivas e de raciocínios, perda de memória, e em casos que o fungo se instalou mais severamente, o paciente pode voltar com um certo grau de demência ou estado vegetativo. — Em unanimidade, eles baixaram as cabeças e engoliram em seco. — Mas isso é tudo especulação. Depois que produzirmos a vacina, vamos às fases de testes em recém infect...

— NÃO! — vociferou Ellie. — Você vai começar curando os infectados e depois indo atrás da vacina.

Yudi ficou surpreso com a reação. Estava se preparando para convencer Ellie, não esperava que ela lhe desse ordens de por onde começar o seu trabalho.

— Olha... fico feliz com sua empolgação, e agradeço muito estar disposta a... — Todos o olharam como se avisassem para tomar cuidado com as palavras. — Ajudar a produzir a cura. Contudo, começar com a vacina seria o melh...

— NÃO! Eu já disse! Se você quer a minha vida, essa é a condição. Terá que começar pela cura dos infectados. — A voz de Ellie era melancólica, porém firme.

— Entendo... Mas precisaríamos de muitas cobaias. E você sabe bem que não é muito fácil conseguir cobaias assim, ainda mais sem uma vacina caso algo dê errado — insistiu o doutor calmamente.

— Está errado. — Maria tomou a voz. — Essa cidade... — respirou fundo como quem controla suas emoções. — A maioria dos habitantes dessa cidade foi transformada em infectados há poucos dias e o que sobrou está reunida de luto a alguns quarteirões daqui. Estaremos todos dispostos a ajudar no que for preciso.

— Ótimo! Digo... — Enrolou-se e curvou-se se desculpando. — Sinto muito por tudo que aconteceu. — Endireitou a coluna e pôs a mão fechada no peito. — Eu juro que farei tudo ao meu alcance para salvar essas pessoas e acabar com a praga do Cordyceps pelo mundo.

Aquela cena, mesmo simples, pareceu encher os corações deles de uma energia que há tempos não sentiam. Esperança. Exceto por Ellie, pois sabia muito bem o que tudo aquilo significava.


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— Quando podem começar? — novamente, Ellie foi direto ao ponto. — Quanto antes começarmos, menores as chances de sequelas, não é?

— Si... sim. Acho que por hoje, se Maria concordar, poderíamos todos descansar um pouco. — Olhou para Maria que, depois de relutar um pouco, concordou desgostosa. — Depois, precisamos de equipamentos cirúrgicos e certos tipos de maquinários. Eu trouxe alguns comigo, mas pra um procedimento dessa magnitude, seria ideal um hospital.

— Temos um hospital na cidade. Por sorte, ele fica no lado Norte, está seguro, por enquanto — falou Maria.

— Perfeito! Posso ir lá amanhã e averiguar se temos os equipamentos necessários. Se tudo estiver ok, amanhã mesmo podemos dar início ao processo.

O tempo congelou para Ellie. Foi como se um iceberg tivesse caído em cima dela. Suor frio escorreu de sua testa enquanto sua garganta se secou como desertos de areia. “Amanhã” pensou ela. Eram muitos sentimentos para processar de uma só vez. Estava feliz por finalmente cumprir o seu propósito, terminar o que havia começado com Joel e Marlene. Mas... sabia o que isso significava. “Dina!” lembrou da garota. Instantaneamente seu corpo cambaleou e pareceu que seus joelhos não existiam. Todos perceberam o movimento de Ellie e Marry ameaçou segurá-la da queda, mas não foi preciso, Ellie se endireitou e começou a respirar ofegante.

— Acho que seria bom se ela se sentasse — advertiu o doutor. — E se possível, ficaríamos felizes se nos recebessem em sua cidade. — Apontou para o esquadrão de Vagalumes.


Fazia algumas horas que a noite havia se adentrado. O céu estava bem estrelado e limpo, exceto por poucas nuvens que nublavam a luz da Lua. Uma noite linda, mas particularmente muito sombria para Ellie. Estava sentada em uma cadeira de praia no alto da muralha de Jackson, com visão para o campo livre e as árvores bem ao fundo para fora da cidade. Preferia encarar a natureza do que a sua cidade parcialmente destruída.

Havia horas que estava lá, sozinha, refletindo sobre tudo o que acontecera e que ia acontecer. Seu diário aberto nas coxas e o lápis na mão, numa forçosa tentativa de se expressar, porém sem sucesso. Sentia como se todos os seus sentimentos e pensamentos, bons e ruins, fossem postos em um liquidificador e se misturavam triturados continuamente desde que avistou os Vagalumes pela tarde.


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A culpa da cidade ter sido destruída; com o alívio de uma possível cura para eles; mas o medo de morrer por conta disso; e a contradição de ser preciso para salvar a vida de Lev; mesmo sem ter certeza de que isso daria certo; mas tendo certeza de que isso era a coisa certa a se fazer.

E Dina? A parte mais densa e complicada de lidar com tudo isso. Dina. Seu amor, a pessoa que mais se importava nesse mundo, inconscientemente, sua verdadeira razão de viver, o que impediu Ellie de morrer em toda essa jornada foi a esperança de reencontrar Dina e JJ novamente, a esperança de que pudessem finalmente ter uma vida feliz juntos depois de tudo que passaram.

Ellie batia o lápis consecutivamente em sua coxa como um tique enquanto se afogava em sua mente cansada e confusa. O que faria? O que queria fazer? O que seria o certo a se fazer? Dina estava bem? Sabia que Víbora havia mandado homens atrás dela, mas sabia também que Dina e Tália se viravam muito bem sozinhas. Ainda assim, era melhor ir atrás de Dina ver se estava bem? Mas se fosse, conseguiria se despedir novamente de Dina, ou desistiria da cura para viver com ela? E os Vagalumes? Deixariam ela ir atrás de Dina ou a prenderiam contra a sua vontade em Jackson? E se fizessem isso, ela fugiria? Ela lutaria e mataria os Vagalumes impedindo a cura assim como Joel fez? Ou desistiria de Dina para produzir a cura? “Ah, Joel... Seria tão mais fácil se tudo tivesse acabado da primeira vez...”

Os dilemas continuavam a açoitando. Seria certo abandonar Dina de novo? Isso se Dina ainda quisesse a presença dela, né? Podia ser que Dina não quisesse mais nada com ela... Mas, mesmo assim, seria certo partir sem ao menos se despedir pessoalmente de Dina? E se fosse esperar para ver Dina, quantas sequelas a mais os habitantes de Jackson teriam? Já foram transformados por culpa dela, não queria sentir mais culpa por negar uma melhor reabilitação a eles atrasando seus tratamentos. Na verdade, não queria sentir mais nada. Era tudo tão confuso, tão denso, tão sufocante. Queria gritar. Queria que acabasse. Queria o colo e carinho de Dina, a risada de JJ... O sorriso de Lev. Ah, Lev... Ele precisava voltar ao normal. Tinha de ser curado a todo custo.

— Oi... — Ellie quebrara o lápis com o susto que tomou quando esta saudação interrompeu sua onda de pensamentos.

Abby acabara de subir as escadas. Estava com roupas limpas, curativos pelo corpo e um bem grande no local que dias atrás estivera sua orelha.


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— Trouxe cerveja... — Mostrou um fardinho com garrafinhas de cerveja. — Achei que viriam a calhar. — Aproximou-se, pegou uma garrafinha, arrancou a tampa e estendeu à Ellie, que olhou relutante, mas, enfim, apoiou seu diário numa mesinha ao canto e pegou a bebida. — Posso? — Apontou para uma cadeira vazia ao lado de Ellie e, mais uma vez, após uma breve hesitação, Ellie acenou com a cabeça.

Ambas ficaram alguns segundos ali, sentadas lado a lado, cada uma com uma garrafinha de cerveja na mão, Ellie olhando catatônica para a garrafa enquanto Abby, inquieta e notoriamente desconfortável, olhava para os cantos e ameaçava começar uma conversa ora ou outra, até que finalmente:

— Me desculpe... por mais cedo. Eu...

— Não precisa. — Ellie se adiantou, encarando a cerveja. Mais uma vez o silêncio se instalou.

— Marry veio falar comigo... Ela... ela fazia parte do primeiro esquadrão de Vagalumes que vinha pra cá. — Abby falava, mas Ellie parecia estar em um lugar distante. — O esquadrão que a puta da Víbora dizimou, aquela desgraçada. — Apertou sua garrafinha com força. — Consegui salvar Marry, mas pra falar a verdade, eu nem lembrava que tinha falado pra ela vir pra cá com os Vagalumes.

Abby notou que nem sequer conseguira fisgar a atenção de Ellie. A garota estava apática, olhando para o chão sem sequer ter tomado um só gole da bebida.

— Ela me contou o que você fez, sua decisão... Muito nobre da sua parte.

— Ah, corta essa! — respondeu Ellie, revirando os olhos.

— É sério. Começar curando os infectados... — Abby respirou fundo. — Obrigada.

— Não fiz por você — respondeu secamente, virando o rosto para o lado oposto de Abby.

— Eu sei... Mesmo assim... Ele... — Abby apertou a própria coxa com a mão em uma força desproporcional. — Ele precisa voltar!

— Ele vai. — Ellie olhou para Abby, que estava curvada e claramente segurando ao máximo suas lágrimas. — O garoto é mais forte do que nós duas. Vai superar essa. — Ellie desviou o olhar e sentiu uma forte apontada no peito. — Tem que superar...


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Abby engoliu o choro junto a um longo e exagerado gole em sua cerveja. Ellie a olhava entendendo perfeitamente o que sentia, e então também tomou um gole. Ao sentir o gosto, engasgou e por pouco não cuspiu a bebida.

— Horrível, não é? — disse Abby, pegando outra garrafinha.

Ellie encarou novamente a cerveja, ficou refletindo por um momento e então deu outro gole, dessa vez mais preparada para o amargo que inundava sua garganta. De certa forma, o gosto estranho caía bem para o momento, o álcool subindo deixava a conversa um pouco mais fácil.

— Você... Teria ido até o final? Sabe... Antes... Se Joel não tivesse...

Ellie enrijeceu o corpo na mesma hora. Ouvir Abby dizer o nome do Joel era como um insulto à memória dele. Porém, aquilo já fazia tanto tempo, e muita coisa aconteceu depois daquilo. Não era a mesma pessoa e não fazia sentido continuar alimentando esse rancor que a envenenou por tanto tempo.

Ellie voltou no tempo, lembrando da viagem com Joel, das pessoas que perdeu em busca dos Vagalumes. Tess, Marlene... Riley... Este último nome em especial lhe deu a certeza para responder à pergunta de Abby.

— Sim...

O silêncio se instalava entre as perguntas e respostas, como se ambas dessem o tempo necessário para absorver a conversa, processar seus próprios sentimentos e retorquir da melhor forma que pudessem.

— Sabe... Um dia antes da sua cirurgia, Marlene questionou meu pai. Ela não concordava em sacrificar sua vida pela cura e perguntou pro meu pai se ele faria a cirurgia se eu fosse a garota imune. Naquele dia, eu disse ao meu pai que gostaria que ele fizesse a cirurgia, mesmo se fosse a mim que tivesse de sacrificar. — Abby contava com o olhar no vazio, como se estivesse observando o momento passado com os próprios olhos. Ellie estava curiosa com o raciocínio de Abby. — Mas naquela época eu era nova, ingênua... Não entendia muito bem o mundo como ele era de verdade. Não que eu saiba hoje, mas... depois de tudo que eu passei... Se fosse pra salvar o Le... — Interrompeu-se engasgando com o próprio choro que ameaçou sair e, depois de uma pausa, uma olhada pro teto e uma longa respirada, continuou: — Se fosse pra salvar o Lev, eu daria minha vida sem pensar duas vezes.


——— Pág 14 ———


— E se... em vez disso, precisasse impedir a cura pra salvar o garoto... Você me mataria por isso? — questionou Ellie de forma ácida.

— Hunf... Eu já tente i te matar... Mais de uma vez, não se lembra?

Ambas ficaram quietas por mais um tempo. Ellie cutucava o rótulo da cerveja com o dedão, como um tique nervoso. Abby parecia ter algo entalado em seu peito em que relutava a liberar, contudo, não haveria outro momento para isso.

— Quando você apareceu no hospital, eu pensei que finalmente teríamos um futuro diferente, que as coisas seriam melhores. Mas... em vez disso, meu pai morreu naquele dia, meus amigos, os parentes dos meus amigos e a possibilidade de um futuro melhor. Eu era nova demais pra lidar com tudo aquilo sozinha. A vida não tinha me ensinado ainda o quanto esse mundo podia ser cruel. A única coisa que me mantinha firme, que me fazia seguir em frente, era o desejo de me vingar do Joel. Eu não conseguia entender como alguém podia ter feito aquilo. Sentia como se fosse meu dever vingar todo mundo, meu único propósito de vida. Uma obsessão tão grande que me deixava cega pra qualquer outra coisa.

Ellie com certeza não esperava que Abby falasse tão abertamente sobre isso. Foi pega de surpresa, mal conseguia entender como se sentia. O ódio por Abby voltara em um turbilhão, contudo, depois de tudo que passaram juntas, por tudo que fizeram uma à outra, um lado de Ellie estava escutando atentamente e tentando entender o que ela passou, mesmo que isso doesse profundamente, mesmo que sua vontade de voar no pescoço dela ali mesmo fosse insuportável, tomou um longo gole em sua cerveja e continuou escutando.

— E onde tudo isso levou? — Abby torceu seu rosto em profunda melancolia. — Não trouxe meu pai de volta, tampouco aliviou a dor e a fúria que sentia dentro de mim. Pelo contrário, só fez com que sentisse um vazio ainda maior no peito... e fez também com que eu perdesse os poucos amigos que haviam me sobrado. — Ellie encolheu os ombros numa mistura de satisfação e arrependimento. — Não peço que me perdoe, mas...


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— Não! — interrompeu Ellie. Ambas ficaram ali, sem coragem de olhar nos olhos uma da outra. Ellie deu mais uma golada na horrível cerveja como se procurasse coragem no fundo da garrafa para pôr para fora o que precisava. — Joel não era um santo. Aprendi na pele que a gente cava a própria cova. Tudo que fazemos tem uma consequência, seja a nós mesmos ou a outras pessoas. Mas... diferente de mim, que matou por ódio e vingança, ele matou pra me proteger, pra que eu pudesse ter a chance de ser feliz. — Ellie olhava para o fundo da garrafa, rodando o último gole de cerveja. — Eu demorei bastante pra entender e perdoar ele. Na verdade... Você me tirou ele antes disso. — Abby engoliu em seco e sentiu seus olhos se esconderem de Ellie. — Mas a vida acaba mais cedo ou mais tarde pra todos nós, não é verdade? Pelo menos que eu possa partir por uma boa causa do que tentando matar uma babaca musculosa.

Abby soltou um leve sorriso triste e melancólico. Nunca pensara que estaria bebendo com Ellie, ainda mais conversando sobre seus sentimentos e tudo que aconteceu. O assunto secava a garganta e descia mais amargo do que a própria cerveja, forçando Abby a pegar outras duas garrafas e entregar uma a Ellie que não relutou em tomar mais um longo gole.

Ao apoiar a garrafa vazia no canto da cadeira, Abby observou um caderninho em cima de uma mesinha, com textos rasurados e um nome escrito em letras garrafais.

escrevendo praquela garota? Dina, não é? — Escutando isso, Ellie pegou rapidamente o diário e o fechou como quem escondesse algo muito precioso. — Desculpa... eu não queria...

A lembrança de Dina fez as pernas de Ellie tremerem. Esse era o assunto mais difícil e delicado a ser tratado no momento. Não conseguira pensar numa forma adequada de se despedir de Dina. Na verdade, não tinha uma forma adequada de se despedir, e por isso Ellie sentia-se sufocada e atordoada só de pensar na situação.

— Põe tudo pra fora — aconselhou Abby. — Seja sincera com ela e aproveita essa chance de se despedir. Sabemos muito bem que nunca temos chance pra isso. — Os olhos de Abby marejaram e sua voz tremulou. — Eu nunca tive...

Ellie ficou olhando para seu diário, refletindo no que Abby disse. Após alguns segundos em silêncio, Ellie encheu o peito e falou com firmeza:

— Você... poderia entregar essa carta pra Dina, por mim?

— Eu?! — Abby ficou realmente surpresa — Acho que não sou a melhor pessoa pra isso.

— Você é a única pessoa daqui que não quer me matar... Pelo menos não mais.

— A que ponto chegamos, não é? — respondeu com certa ironia. — Pode contar comigo, eu entrego a carta.

— E me promete uma coisa?


——— Pág 16 ———


— Relaxa, eu não vou ler ela.

— Não. Não é isso. Bom, também... — Abby ficou curiosa em saber o que Ellie queria. — Olha... Cuida bem do Lev, ? Ele sim merece ser feliz. Mais do que nós duas juntas.

Abby não conseguiu segurar suas lágrimas, o ar em seus pulmões sumiu como mágica e soluçou emocionada em imaginar que Lev poderia voltar ao normal. Era uma esperança frágil, porém, era tudo o que mantinha Abby “firme”.

— Eu prometo! — respondeu em tom alto e claro, apesar da voz trêmula e chorosa.

Ellie deu um meio sorriso, satisfeita e olhou para o nome de Dina em seu diário com carinho. Abby entendeu que era sua hora de partir, se levantou, ficou um momento encarando as estrelas e enfim disse:

— Queria que tivesse outra maneira.

— Hunf... até parece. Você sempre quis se livrar de mim.

Você sempre quis se livrar de mim!

O olhar delas se encontrou por um breve instante. Foi como se encarassem diretamente a alma uma da outra e mergulhassem num turbilhão de lembranças e sentimentos. Um breve segundo que se encerrou com Abby dando as costas em direção às escadas e, ao descer os degraus, antes que sumisse completamente da visão de Ellie, olhou para ela e puxou ar para dizer uma última coisa, mas a viu olhando concentrada para o diário, como se já estivesse com a mente imersa e distante. Abby desistiu, baixou a cabeça e falou baixinho.

— Adeus, Ellie Willians.


9 Comments


WILLYAN GUSTHAVO MAIA PIRES
WILLYAN GUSTHAVO MAIA PIRES
Apr 19, 2022

Eu chorei com esse episódio, poderia ser claramente um The last of us 3, porra que episódio fantástico, todos foram excelentes mas esse em especial me deixou extremamente triste e também alegre, The last é uma obra magnífic

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Kevin de Almeida
Kevin de Almeida
Apr 28, 2022
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Muito obrigado Willyan! Como você, eu gostaria muito de transformar essa fic no jogo de verdade, por isso fiz o outro post falando sobre isso. Dá uma olhadinha lá, e se acredita no meu trampo, dá aquela forcinha pra compartilhar =D já até deixei uns links fáceis já pra ajudar.

E valeus por ler minha obra e por dar seu feedback, isso incentiva muito a continuar escrevendo.

Tamo junto Willyan, agora só aguardar o último capítulo hehe

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Arthur Marcolan
Arthur Marcolan
Apr 15, 2022

Agora falando, como jogador(jogava the last of us no ps3 ainda desde seu lançamento) e fã da franquia, eu realmente entrei dentro do mundo do jogo lendo isso, eu consigo os personagens falando as frases na minha cabeça, as frases clássicas dos personagens, suas características, seus modos de agir, trazem uma realismo ainda maior, a minha conclusão, essa fanfic é digna de ser chamada de continuação da franqui, meus parabéns ficou perfeito, pode ter certeza que irei te seguir nas suas redes e recomendar seu trabalho, isso merece ser lido por todos os fãs de TLOUs.👏🏻👏🏻

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Kevin de Almeida
Kevin de Almeida
Apr 15, 2022
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Muito obrigado Arthur, tamo junto demais. Obrigado pelos elogios e por compartilhar meu trampo! Fico lisonjeado mano haha foi um trampo danado escrever uma história que desenvolvesse e respeitasse os personagens, e fico muito feliz em ver que fez você ter todas essas sensações com a obra.

Logo menos eu posto os próximos capítulos. Valeus man!

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Bruno Oliveira
Bruno Oliveira
Apr 08, 2022

Nossa, esse final foi de apertar o coração, a obra tá excelente!


Como você imaginaria a jogabilidade no console? Já que temos partes da obra que abordam vários personagens (Ellie, Abby, Lev, Tommy, etc)

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Bruno Oliveira
Bruno Oliveira
Apr 12, 2022
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É verdade, seria uma alternativa bem interessante para a série. Ansioso pro próximo capítulo!

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Emanuel Lima
Emanuel Lima
Apr 07, 2022

Manooooo! Ansiedade a 10000 pelo final! Jeová dos exércitos!

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Kevin de Almeida
Kevin de Almeida
Apr 11, 2022
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hahaha adoro sua empolgação nos comentários. Essa semana já tem o próximo capítulo. Obrigado por sempre estar lendo e comentando. Tamo junto Emanuel

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