The Last of Us Part 3 - Vol. 22 - Fuga
- Kevin de Almeida
- 17 de fev. de 2022
- 33 min de leitura
Atualizado: 18 de abr. de 2022

THE LAST OF US
PARTE III
FANFIC
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Agradeço a compreensão e respeito de todos e desejo uma excelente leitura.
Autor: Kevin de Almeida Barbosa — Instagram: @escritorkevindealmeida ; @thelastofus.part3
Capa: Rafael Cardoso — Instagram: @r.c.dossantos
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Fuga
— Você tem certeza? — Abby parecia não acreditar no que tinha acabado de ouvir. Lev consentiu desamparado, seus olhos transmitiam o desespero da situação que estavam.
Uma cidade inteira transformada em infectados que provavelmente já haviam comido os Cascavéis que deveriam proteger a Besta Ruiva, essa que naquele momento mal conseguia se manter em pé pelas atrocidades que sofrera pela Víbora. Ela estava sentada no canto do quarto, alternando entre mordidas em uma barrinha de cereal e banhos de água gelada de um balde no rosto, tentando recobrar totalmente a consciência. Era nítido que ainda não estava sã, suas pupilas estavam muito dilatadas e sua respiração ora se acalmava em longas inspirações, ora acelerava ofegante e descontrolada.
— Acabou... — Leve caiu sentado, totalmente abatido. Olhava para o chão como se aceitasse pouco a pouco o que estava por vir.
Abby estava ali, parada, em pé, encarando Lev e Ellie. O que fariam? Ellie não estava em condições de continuar, quanto mais fugir de uma cidade inteira de infectados e Cascavéis. Lev estava derrotado psicologicamente, minutos antes surtara com todas as matanças que acabaram se tornando a vida dele, e naquele momento, o último pingo de esperança parecia se esvair de seu ser a cada expiração. Abby não estava muito diferente, cansada de tantas lutas, cansada de matar e sobreviver, de ver seus amigos morrerem na sua frente, de ter seus planos estragados por algum lunático ou infectado maldito. Lutou por tanto tempo e onde chegou? Parecia apenas estar adiando o inevitável, sempre batalhando por mais um dia de vida que poderia acabar sem aviso prévio. Teria sido tudo em vão?
Lev olhou para um gibi da Savage Starlight que estava em uma pilha com outros livros, o pegou e começou a folhear. Aquilo intrigou Abby, no meio de uma situação sem saída, como Lev tinha cabeça para ler um gibi? Mas talvez não tivesse, talvez só quisesse esquecer por um instante da morte eminente, talvez só quisesse se distrair como um adolescente normal e se divertir. Por um instante, Abby olhou para Lev e se lembrou de Owen, sempre tão avoado querendo fugir dos treinos e responsabilidades para sair com Abby, namorar, explorar o aquário, brincar de arco e flecha de mentira, enfeitar a casa com luzinhas de natal. Ao mesmo tempo que a memória lhe trazia paz, também lhe trazia uma melancolia profunda. Ela sentia falta de Owen, e acabou se apegando a Lev e ao Stiven exatamente por esses motivos. Eles tinham um lado inocente encantador, sempre curiosos com o mundo, querendo descobrir as coisas e se divertir. Mas ela mesma... sempre tão focada nos treinos, tão obcecada pela vingança por Joel, tão vidrada em achar os Vagalumes e, por último, tão determinada em achar a cura e honrar a memória de seu pai.
Mas e Lev? Quando ela perguntou para ele o que ele queria fazer? Quantas vezes perdeu a paciência com sua curiosidade exacerbada? Ele mal se tornou um adolescente, mal processou todas as mortes que sofreu e executou, mal se descobriu como pessoa, mal aproveitou as belezas desse mundo. Sim, havia beleza nesse mundo. Abby lembrou dos momentos com seus amigos, da instalação da WLF cheia de gente, das festas que tinham lá, dos momentos que passou com seu pai, do romance que teve com Owen, das descobertas do aquário que naquela época... Ela não dava valor, mas naquele dia se lembrava com muito carinho. Lev era muito jovem e teve uma vida muito difícil, entretanto, ela nunca o viu reclamar ou se abater. Ele sempre estava animado em descobrir as coisas, sempre pregando aquelas palavras da Profetiza que, por mais que Abby não gostasse, tinha de admitir que eram palavras gentis e de amor. Abby nunca perguntara o que Lev queria fazer de sua vida, ele sempre a seguiu sem questionar e naquele momento estava à beira da morte eminente por conta disso.
——— Pág 1 ———
— Lev! O que você faria se pudesse viver em paz? — questionou Abby. Lev e Ellie estranharam a pergunta repentina e aleatória e ficaram sem reação. — Anda, Lev, o que você gostaria de fazer?
— Ham... eu queria ver esses tais filmes de tevelião — respondeu tímido.
— Perfeito! E o que mais?
— Abby... a gente precis...
— Responde, Lev! O que mais você quer fazer num mundo de paz?
O garoto ainda estava meio contrariado, mas respondeu pensativo:
— Eu queria ler os livros sagrados antigos que a Tália contou.
— Vaaamos, Lev, seja mais criativo. Me conta algo que você sempre quis fazer e acha que nunca conseguiria.
Dessa vez o garoto torceu o nariz e se esforçou mais para responder.
— Uma montanha russa!
— Isso, garoto! Agora sim! Uma daquelas que deixa você de cabeça pra baixo...
— ESSA MESMO! — Ele pareceu se empolgar. Ellie olhava sem entender o que estava acontecendo.
— E fazer brigadeiro?
— Aqueles docinhos marrons que o Stiven fez pra gente? Você sabe fazer? — Os olhos dele brilharam de excitação.
— Ele me ensinou, e vou te ensinar também! E não só isso, vou te levar pra uma biblioteca onde existem milhares de livros iguais ao da Profetiza pra você ler.
— Existe mesmo um lugar desses?
— Claro! E existe locadoras também, com todos os filmes que você quiser ver nas televisões.
— Jura?! — Lev abriu um sorriso.
— E as montanhas russas? Existem os tais parques de diversões com várias montanhas russas diferentes pra você ficar dando piruetas e mais piruetas até vomitar.
— Mentira!
— É sério! E eu vou te levar pra conhecer todos esses lugares. Quando essa nossa missão acabar, você vai escolher qual será o nosso próximo destino. — Ellie deu um sorriso de canto de boca ao escutar isso. — A gente vai fazer todas essas coisas legais e muito mais!
Abby se aproximou do garoto e pôs as mãos nos ombros dele.
— Nós vamos mudar tudo isso, Lev, você nunca mais vai precisar matar ninguém e nos dois vamos desbravar as maravilhas desse mundo juntos.
——— Pág 2 ———
O rosto de Lev estava cheio de vida novamente, parecia animado com o discurso de Abby, mas, por um instante, seu olhar se entristeceu e olhou para a porta ao escutar um grito de infectado do lado de fora. Abby puxou o rosto do garoto e o obrigou a encará-la.
— Ei, me escuta! A gente vai sobreviver! Nós saímos da ilha dos Serafitas no meio de uma guerra, nós conseguimos sobreviver aos Cascavéis em Santa Barbara e nós também saímos daquele túnel infestado de infectados. Nós vamos sair dessa também. Então, se recomponha, pois vamos mostrar pra esses putos porque eles não devem mexer com a gente. — Abby andou em direção à Ellie e colocou a mão em seu ombro. — Como você tá?
Naquele momento, Abby a estava olhando com preocupação. Nunca em sua vida imaginou que Abby estaria a olhando de forma sincera e com tanta paz no coração. Não mais aquele olhar de ódio, não mais aquele olhar rancoroso, mas o olhar de uma amiga que oferecia ajuda. Ainda era tudo muito confuso para Ellie, ela estava muito machucada e cansada, sua mente ainda ia e vinha com leves alucinações e sua sobriedade ainda era bem questionável, mas mesmo assim acenou que estava bem.
— Olha, a situação tá bem tensa lá fora. Os infectados de Jackson foram libertados, então aquilo vai estar um mar de fungos carnívoros, mas pelo menos isso vai distrair os Cascavéis. Ah, e mais uma coisa, antes de virmos te resgatar, achamos alguns sobreviventes e os libertamos.
— O quê?! — Ellie sentiu seu coração palpitar.
— Uma mulher imponente, Maria, disse que levaria os sobreviventes pra uma sala do pânico e que os tiraria daqui.
— Maria... — Ellie estava confusa, mas muito aliviada em saber que pelo menos houve alguns sobreviventes. — E Tommy?
Abby não gostava de Tommy. Além de ser irmão de Joel, ele havia matado Manny e muitos outros amigos dela, mas engoliu suas frustrações e respondeu secamente:
— Está vivo, junto a Maria. — Um alívio tremendo relaxou os ombros de Ellie, mas não teve tempo de processar a informação. — Agora a gente precisa de você, Ellie. Não sabemos como sair daqui, e não vamos ter tempo de pensar no caminho enquanto fugimos dos infectados. Precisamos pensar numa rota de fuga aqui e agora. Você tem alguma ideia?
Por mais que sua mente estivesse mais para lá do que para cá, Ellie entendia muito bem a situação em que se encontravam. Sua cabeça doía e não tinha muita ideia do que fazer, mas se forçou a formular um caminho em sua mente.
— Vamos sair pelo portão do Norte. Estamos mais próximos de lá e, com essa confusão, vai ser mais fácil passar despercebidos pelos Cascavéis.
— Beleza. Lev, você vai ficar encarregado de dar cobertura pra mim enquanto eu carrego a Ellie.
— Me carregar? — Retorceu o rosto em desaprovação. — Sem chance!
— Não está aberto a discussão, Ellie. Você foi baleada, torturada e drogada, não tá em condições de aguentar uma fuga dessas, você morreria no caminho e tudo isso teria sido em vão. — Ellie virou o rosto em uma careta, totalmente contrariada, mas, lá no fundo, concordando com Abby. — Me diz onde tem lençóis pra eu te amarrar nas minhas costas.
——— Pág 3 ———
Poucos minutos depois estavam todos prontos. Lev armado até os dentes com flechas de madeira, metálicas e até explosivas. Seus olhos queimavam excitados e nervosos pelo que estava por vir. O medo o atormentava lá no fundo, contudo reforçava as promessas de Abby na cabeça “Vou andar de montanha russa, aprender a fazer brigadeiro, ver filmes na tevelisão...” e, como um mantra, o mantinha focado e motivado. Abby estava de pé com Ellie amarrada com lençóis às suas costas. Com algumas amarras e nós, conseguiram improvisar uma cadeirinha para suportar Ellie e prender a cintura dela à cintura de Abby, bem colada para que Abby pudesse ter mais liberdade nos movimentos sem se desequilibrar. Ellie estava bem abatida, olhar cansado, mas com seu revólver na mão, pronta para usá-lo.
Abby jogou um pouco de água do balde no rosto, deu uns tapas na própria cara e em seus braços, deu alguns pulinhos e disse:
— Vamos sair desse inferno!
Os três saíram devagarinho pela porta da frente. Avistaram na entrada da cerca. a alguns metros, vários infectados agachados devorando o que um dia devia ter sido um Cascavel que falhou em proteger a Besta Ruiva.
— Pula a cerca atrás da minha casa e segue a esquina daquela casa amarela — orientou Ellie e assim o fizeram.
Os bairros residenciais estavam infestados de infectados, eles andavam para lá e para cá sem rumo, como se explorassem sua antiga cidade, porém naquele momento se contorcendo em aflição pelo maldito fungo que apodrecia seus cérebros. Os três desviaram de um grupo de infectados e continuaram seguindo as orientações de Ellie.
Não havia Cascavéis nos arredores, isso por um lado era bom, pois os infectados estavam calmos, alguns parados, outros agonizando em espasmos e outros perambulando. Isso era melhor do que uma batalha com Cascavéis que poderia atiçar uma quantidade infinita de infectados e fazer a cidade ser inundada por um tsunami de mortos-vivos raivosos.
E assim seguiram por bons quarteirões, sempre na miúda, devagar, silenciosos. Evitavam todo tipo de contato visual e combinaram que só usariam as armas de pólvora como último recurso, não podiam alertar suas posições, caso contrário, seriam devorados em poucos minutos. Lev, por outro lado, agia sorrateiramente e extremamente eficiente. Por seu arco ser silencioso, ele era encarregado de limpar o caminho. Atirava na cabeça de corredores sem dar-lhes chance de gritar e alertar os outros, em outras situações, jogava pedras e tijolos para despistar a atenção dos zumbis fungosos e liberar as passagens que Ellie indicava.
— Por aqui — orientou Ellie mais uma vez. Lev se adiantou e foi averiguar se o caminho estava livre. Tudo bem difícil e cansativo, mas estavam tendo sucesso em passar despercebidos.
— Perfeito, se continuarmos assim conseguiremos sair daqui. — Abby, apesar de apreensiva pela situação, demonstrava esperança em seu olhar.
— Por que você ajudou eles? — perguntou Ellie com a voz baixa.
— Como é? — Abby não esperava por uma pergunta repentina dessas.
——— Pág 4 ———
— Tommy, Maria e os outros. Por que você veio comigo pra ajudar eles? — Ellie não entendia porque Abby aceitou ajudar a salvar os amigos da assassina dos seus próprios amigos. Não fazia sentido algum. Abby ficou em silêncio por um tempo, o rosto fechado.
— Tá livre, podem vir — disse Lev baixinho, seu arco na mão e olhar atento aos arredores.
— Eu devia isso a eles. Direita ou esquerda? — desconversou Abby.
— Esquerda... — apontou Ellie e Lev se adiantou para repetir o processo de proteção. — Como assim? Você nem conhecia eles. Eu devia isso a eles, não você.
Abby bufou cabisbaixa e deu um tranquinho com a cintura para ajeitar Ellie em suas costas.
— Olha... Eu e Lev íamos morrer em Santa Barbara naquele tronco, mas então você apareceu... sei que não foi a intenção, mas você salvou a gente aquele dia — disse Abby ainda seguindo Lev atenta. — E meio que por isso seu povo acabou sofrendo nas mãos dos Cascavéis. Eu... Sinto muito por eles...
Aquilo deu um estalo na mente de Ellie. Era verdade. Se ela tivesse deixado para lá, se tivesse esquecido a maldita vingança, ela estaria na fazenda com Dina, Jackson estaria intacta e Abby estaria morta.
— Não por mim, porque eu não mereço, mas pelo garoto... Obrig... — Abby tentou agradecer quando...
— AARRRGGHHUU! — Um infectado apareceu do nada de uma esquina e pulou em cima de Abby. Ellie puxou seu revólver, mas estava próximo demais para conseguir mirar direito. Lev surgiu e enfiou uma flecha na nuca do infectado.
— Rápido, agacha aqui. — O garoto empurrou as duas para trás de uma mureta e sacos de lixo. Os três agacharam e viram quatro corredores passarem por onde estavam, procurando pelo grito do infectado que morrera. Abby e Ellie olharam para Lev, tinham perdido as contas de quantas vezes ele as salvara e impediram-nas de se matarem. — E agora, Ellie, onde?
Ellie estava perdida em seus pensamentos, sua mente ainda não funcionava como devia. Pensar em caminhos, ser carregada pela assassina de Joel, lidar com as consequências terríveis de seus atos vingativos, tudo isso em meio a zunidos no ouvido e imagens que se liquefaziam de vez em quando por conta do efeito do veneno que ia e voltava.
— Pra... Pra lá — disse com dificuldade, tentando se concentrar.
Os três deram a volta por trás da mureta para evitar os infectados e seguiram mais alguns metros até que...
KABOOOOOOOOOOOOMMMMM!!!!!!!
Uma enorme bola de fogo advinda de uma explosão descomunal engoliu boa parte de Jackson. A fumaça que lembrava um cogumelo alcançara cerca de cinquenta metros de altura. O ar da explosão jogou nossos três heróis no chão, quebrou a vidraça de inúmeras casas ao redor e desmoronou várias construções à frente deles. Era uma imagem aterrorizante, o céu havia sido pintado de laranja avermelhado, a fumaça substituíra as nuvens e nublava toda a cidade, a temperatura virou um forno abafado e infernal e o caminho dos três foi destruído, pois naquele momento só restavam destroços e chamas à sua frente.
——— Pág 5 ———
Ellie estava arrasada. Jamais imaginara que pudesse acontecer tamanha desgraça à Jackson. A cidade estava sendo reduzida literalmente a cinzas. Os habitantes viraram infectados, os Cascavéis tomaram suas casas e então isso, uma labareda de fogo que destruiu o que um dia ela chamou de lar. O zunido em seu ouvido começava lentamente a diminuir, dando espaço a uma voz feminina que clamava pelo seu nome.
— Ellie.... Ellie... ELLIE!!! REAGE, MULHER! — Abby chacoalhava Ellie em suas costas e dava tapas na perna dela. — PRA ONDE A GENTE VAI?!
Era verdade, Ellie não tinha tempo para lamentar a destruição de sua cidade e de seu povo. Estavam em uma situação crítica. Já que seu ouvido parava de zunir, ela escutava outro som aterrorizante, o som de centenas de infectados enraivecidos e eufóricos pelo barulho da explosão e estavam indo em direção a eles já que nossos protagonistas estavam entre os infectados e o local da explosão.
— Abby... — chamou Lev, puxando seu arco e olhando em direção a uma rua que começava a brotar dezenas de infectados.
— ELLIE! ACORDA! PRA ONDE?! — insistiu Abby, mas Ellie não sabia, não tinha para onde ir. A saída do Norte acabara de sair de questão, não tinham como atravessar metros e metros de destroços flamejantes, e também não tinham como voltar, pois atrás deles havia centenas de infectados agitados correndo até eles.
— Acabou... — murmurou Ellie.
Infectados surgiam de todas as direções, não havia tempo para pensar, não tinha como fazer um plano, nem ao menos escolher um caminho. Naquele momento, era apenas uma fuga pela sobrevivência. Abby corria com Ellie nas costas, usava sua MP5 com rajadas de tiros para afastar os infectados que apareciam das laterais. Lev corria logo atrás dela, ele não desperdiçava suas flechas, pois havia muitos deles e precisava usar sua munição com sabedoria.
Abby dobrou a esquina na direita, mas um mar de infectados surgiu de lá, ela olhou para a esquerda e viu Lev usando seu arco como porrete tentando afastar três infectados de cima dele. Abby puxou Lev pelo colarinho e usou seu ombro para arrombar uma porta. Eles correram por dentro da casa, atravessaram os cômodos fugazmente, entraram na cozinha, Lev fechou a porta e a prendeu com uma flecha metálica. A porta sofreu um estrondo com as dezenas de infectados do outro lado e era nítido que a flecha não aguentaria nem por um minuto. Abby pegou um pote de açúcar da bancada e gritou para que Lev lhe desse um pouco da pólvora em sua aljava. A janela da cozinha se quebrou e corredores adentraram tão eufóricos que nem esperavam ficar em pé para correrem atrás de seu banquete, e assim seguiam rastejando, engatinhando e se atropelando.
Lev abriu a porta dos fundos e saiu da casa seguido por Abby que jogou uma bomba de fumaça improvisada logo na saída, confundindo os corredores e ganhando alguns segundos. Ellie não entendia porque eles continuavam lutando, não tinha mais o que fazer, não havia mais saída. Ellie perdera tudo, seus amigos, sua cidade, sua dignidade e, então, sua vontade de batalhar. Seu corpo doía enquanto era carregada pela maior de suas inimigas que dava sua vida para protegê-la, sua mente gritava junto aos uivos de infectados demoníacos e famintos, sua visão alternando entre leves alucinações em uma terrível badtrip de fuga do inevitável fim que as aguardavam. A morte.
Porém uma coisa a intrigava. Abby e Lev estavam desesperados e exaustos, mas eles não desistiam nunca. Ellie assistia de camarote à luta incessante deles pela improvável sobrevivência. Eles gastavam munição, gritavam um com o outro indicando caminhos e inimigos, se puxavam e se empurravam para salvarem um ao outro de mordidas e arranhões fétidos e fungosos. Eles ainda tinham esperanças... mas de quê?
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Tinham acabado de correr por uma estufa em chamas e saíram em uma rua com muros nas laterais e um cruzamento a seguir. Não tinham outro lugar para correr a não ser seguir em frente. Uma das muretas mais adiante cedeu e, em meio aos tijolos que caíam, mais dezenas de infectados tombaram juntos impedindo o caminho. Pronto. Era o fim. Estavam sendo perseguidos pelas costas e, então tinha um monte de infectados à frente. Mesmo eles caídos e desorientados, seria impossível passar por cima deles sem serem mordidos, e os muros laterais eram altos demais para pular sobre. Ellie respirou fundo e olhou para o céu se perguntando se finalmente ela iria reencontrar Joel, e instantaneamente a imagem dele veio em sua mente. Ele estava desesperado gritando com ela. “Ellie! Se protege!”. O que foi aquilo? Uma lembrança? Uma alucinação? Sentiu as mãos de Joel cobrirem sua cabeça protegendo-a de algo. Ela olhou para trás e viu Lev, com duas flechas engatilhadas apontando-as em sua direção, flechas com pacotinhos amarrados nas pontas. Ellie arregalou os olhos ao ver Lev atirando as flechas contra si, foi quando se deu conta que eram as mãos de Abby que protegiam sua cabeça enquanto as flechas passaram triscando pelo seu lado e voaram à sua frente atingindo o amontoado de infectados que impedia sua passagem.
Uma grande explosão desmembrou os corredores jogando pedaços e mais pedaços de corpos e membros para todos os lados, enquanto uma passagem de sangue, corpos e fogo se abria adiante. Abby pulou pela passagem com Ellie nas costas e conseguiu seguir com a fuga enquanto alguns infectados resistentes que sobreviveram a explosão das flechas de Lev se levantavam. Lev seguiu logo atrás, mas, ao pular, foi pego pela perna por um dos infectados no chão que, mesmo pegando fogo, não desistia de seu banquete.
— LEV! — Abby virou e começou a atirar com sua MP5 nos infectados ao redor de Lev para tentar lhe dar alguma cobertura.
— SAI DAQUI, ABBY! LEVA A ELLIE! — O garoto gritava enquanto tentava se libertar do corredor flamejante que mordia incessantemente seu All-Star.
— NÃO SEM VOCE! — Abby retornou atirando tentando ajudá-lo, mas foi surpreendida por um encontrão de outro corredor que a derrubou. Ela e Ellie caíram no chão e logo em seguida o infectado pulou em cima delas.
Ellie se perguntava porque continuavam lutando nessas condições até que sentiu sua mão enroscar em algo metálico e puxou com força para se libertar. Ela arrebentou a correntinha de Abby com um pingente dos Vagalumes.
Vagalumes.
Aquele pingente fez Ellie adentrar fundo em suas memórias. Ela foi transportada para sua infância, nos campos de quarentena. Lembrou de como ela invejava os Vagalumes, aqueles que se rebelavam contra os militares e buscavam pela luz. Lembrou de quando conheceu Riley e de como elas conheceram Marlene, a líder dos Vagalumes na época. Lembrou da morte de Riley e de Marlene apresentando ela a Joel para a missão de atravessar o país para encontrar outros Vagalumes e desenvolver uma cura. Em seguida, toda a viagem com Joel passou em um piscar de olhos. Quando ele descobriu que ela era imune; de Tess encorajando achar a cura e morrendo pouco tempo depois; a viagem com Joel; de ele a salvando inúmeras vezes, e de ela o salvando quando foi ferido pelo vergalhão no abdômen. Lembrou de como eles começaram a se dar bem e se tornaram queridos um para o outro, e de quando encontraram as girafas, se aproximavam cada vez mais do destino final e da conversa com Joel:
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“— Não temos que fazer isso. Sabe disso, né? — disse Joel segurando a porta fechada.
— Qual é a outra opção? — perguntou Ellie.
— Voltar pro Tommy, e... Esquecer toda essa droga.
— Depois de tudo que passamos? De tudo o que eu fiz? — Ellie desviou o olhar de Joel por um instante e voltou decidida. — Não pode ser em vão — concluiu, abrindo a porta e seguindo caminho.”
Ela lembrou que vivia por uma esperança, por honrar a morte de quem amava, de achar um jeito de melhorar esse mundo, de dar razão à sua condição única. Afinal, ela nasceu assim, ela e só ela era imune dentre tantas pessoas, ela e só ela era capaz de criar um mundo melhor para Dina, para JJ, para Tommy, Maria... e para Lev. Até ela estranhou o pensamento quando se lembrou do garoto, mas acabou se afeiçoando a ele. O jeito inocente e divertido, o cuidado e atenção, a curiosidade e vontade de conhecer o mundo. Ele a lembrava dela mesmo quando era jovem, quando lia sobre o espaço e dinossauros, quando ia em museus e tocava violão, quando fazia amizades e amores. É para isso que lutamos, é para isso que batalhamos, para que as pessoas tenham a chance de ser felizes, para que as pessoas tenham o direito de serem felizes.
Ellie voltou a si, viu Lev deitado no amontuado de infectados brigando fervorosamente por sua vida, e viu Abby lutando contra dois infectados que tentavam comer elas duas. Ellie apertou o pingente dos vagalumes e sacou seu revólver, deu dois tiros eliminando os infectados de Abby.
— O GAROTO, AJUDA ELE! — gritou Ellie, pegando a MP5 de Abby e atirando contra os infectados que tentavam jantar Lev. Com as mãos livres e com Ellie atirando, Abby correu em direção ao garoto, tirou os infectados de cima dele e o puxou.
Ele estava sem um dos tênis, com a camiseta inteira rasgada, com ralados pelo corpo e, quando foi puxado por Abby, um infectado esticou a cabeça e...
— AHHRRGG!! — gritou Lev ao sentir dois dedos dele serem mordidos pelo infectado. Ellie atirou na cabeça do desgraçado e Abby, sem pensar duas vezes, sacou sua faca e arrancou os dois dedos de Lev. Foi tudo muito rápido e ainda mais infectados corriam atrás deles.
— Pra direita, na casa azul! — ordenou Ellie.
— Demorou pra caralho, hein? — rugiu Abby para Ellie, arrastando Lev que ainda processava o que tinha acabado de acontecer. — Você tá com a gente, Lev! Ele não te infectou! Concentra! — motivava o garoto a continuar focado em sobreviver.
Eles correram na direção que Ellie ordenou e viram mais casas, becos e um galpão com caminhões e toras de árvores amarradas e empilhadas.
— Lev! Derruba as toras assim que a gente passar! — apontou Ellie.
O garoto terminou de rasgar um pedaço de pano de sua camisa que já estava quase se soltando por conta do ataque que sofrera, enrolou em seus dedos recém decepados e jogou um pouco de álcool que tinha na mochila para tratar do ferimento. Lev gritou com força e acabou deixando o recipiente de álcool cair no chão desperdiçando o suprimento, mas eram coisas demais para processar, havia sido mordido e instantaneamente tivera seus dedos arrancados, ainda estavam sendo perseguidos enquanto ele tratava de sua ferida dolorida para usar sua mão, então aleijada, para salvar todos com um tiro perfeito de arco. Era muita responsabilidade, mas seu mantra se repetia em sua mente, dizia a si mesmo que iria viajar com Abby, que ela iria mostrar as bibliotecas, locadoras e parques de diversões. Ele queria viver, ele queria conhecer o mundo, ele queria descobrir o lado bom da vida com Abby.
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— AAAAHHHHHHH! — gritava Lev e atirava flecha atrás de flecha contra as cordas que prendiam as toras de madeira, e conforme foi acertando, os enormes cilindros de madeira pesada caíam e rolavam.
Abby e Ellie tinham acabado de passar, mas Lev ainda estava na direção das vigas. Se ele tivesse esperado mais, as vigas não acertariam os infectados e teria sido inútil, então preferiu arriscar que conseguiria desviar das vigas. O garoto pulou pela primeira e pela segunda, mas a terceira acertou seu pé descalço e o desequilibrou. Viu o chão chegando junto a outra viga que rolava até que seu braço foi puxado para o lado e o livrou por pouco de ser esmagado pelas toneladas de madeira que destroçavam os infectados atrás deles.
— Isso foi incrível, Lev! — disse Ellie, a autora do salvamento do garoto.
Lev não conseguiu responder, estava extremamente ofegante e suado. Caiu de joelhos e sentiu o céu girar, sua visão turva agravou uma apontada em seu estômago que o fez vomitar.
— LEV! Você tá bem?! — Abby se agachou preocupada, olhava para o garoto como uma mãe olha para seu filho doente. Lev se jogou para o lado e sentou desajeitado, sua respiração ainda muito acelerada e ele visivelmente exaurido. Não aguentava mais lutar, mas, mesmo assim, fez um joia com o dedo para Abby, joia que aprendera com Ellie, observando-a fazer várias vezes durante sua jornada.
Abby, apesar de não ter sofrido injúrias e se portar como se estivesse bem, também estava esgotada. Carregar Ellie enquanto fugia por sua vida era cansativo demais, contudo precisava se manter firme, estava sendo o pilar psicológico do grupo, tinha que estar bem por eles.
— Tomem fôlego, ganhamos um tempo com as toras, mas precisamos sair daqui rápido. Já pensou em algum lugar pra gente ir, Ellie? — falou Abby com a voz cansada.
— Não dá pra saber. Essa explosão engoliu metade da cidade, pra ter tido esse poder, deve ter acontecido na usina.
— Tá, mas deve ter algum lugar que possamos ir — insistiu Abby, tinha que ter uma saída daquele inferno.
— Eu preciso saber até onde essa explosão vai pra saber que caminhos ainda podemos usar — respondeu Ellie puxando o lençol que apertava demais seu ombro, tentando afrouxá-lo um pouco.
— Al... altura — Lev se esforçou para falar. — Pra ver... humph... humph... a... cidade.
Ellie parou por um momento, seus olhos agitados se debatendo raciocinando um lugar alto. Começou a olhar os arredores e ao fundo se deparou com uma antena de rádio colossal.
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— A estação de rádio. Lá tem uma antena transmissora alta o suficiente pra gente enxergar a cidade inteira. De lá, a gente consegue descobrir qual caminho seguir...
Ellie mal terminou de falar e os infectados começaram a brotar novamente. Saíam dos entulhos das toras, alguns desmembrados, outros intactos, mas todos famintos e sedentos por suas presas.
— Vai ter que ser isso! — Abby se levantou e puxou Lev pelo braço o obrigando a ficar em pé também.
Novamente a fuga se tornou a prioridade. Todos os três estavam exaustos e em seus limites. Abby tinha poucas balas de MP5 assim como Lev também tinha um número bem limitado de flechas. Só Ellie ainda tinha bastante munição de revólver, mas amarrada às costas de Abby, não conseguia atirar para trás para retardar os corredores.
— Pra onde, Ellie?
— Direita!
— E agora?
— Continua reto!
Abby e Lev seguiam às instruções correndo, enquanto se esquivavam de infectados que brotavam das laterais, de janelas, de becos e de trás deles. Correram por mais dois quarteirões em meio a desespero, tiros e muita gritaria.
— Dobra essa esquina — ordenou Ellie e assim Abby o fez, porém a esquina estava lotada de mais infectados.
— Aqui não dá! E agora? — disparou Abby. Ellie pensou, olhou para os lados, reconheceu as casas onde estava e hesitou por um momento. — ELLIE!
— Vira à direita naquela casa azul. Tem um beco que dá pra cortar caminho.
Abby mais uma vez seguiu as orientações de Ellie seguida por Lev logo atrás. Os infectados estavam a cerca de cinco metros de distância deles. Tinham ganhado uma vantagem por conta das toras de madeira, mas, ainda assim, um pequeno deslize, um tropeço ou um caminho errado poderia ser a diferença entre a vida e a morte deles. Quando chegaram no beco tiveram uma miserável surpresa.
— Está... fechado. — Ellie não acreditava no que via. A passagem que conhecia foi fechada. Um muro cinza, aparentemente construído há pouco tempo, pois não havia nem sido pintado ainda, impedia que eles seguissem em frente. Abby olhou para as paredes do beco, nenhuma janela, nenhuma escada, nenhum latão de lixo que pudessem usar para escalar. Então olhou para trás e viu os infectados entrando no beco, não havia como voltar, não havia como prosseguir, não havia o que fazer. Mas Ellie notou que Lev estava apontando duas flechas metálicas em sua direção, e antes que pudesse raciocinar o porquê de o garoto estar fazendo isso, ele atirou.
Em uma fração de segundos, Ellie achou que Lev estava sendo misericordioso e atirando as flechas nelas para que morressem antes de serem devoradas vivas, mas as flechas passaram por elas e foram em direção ao muro.
— ESCALEM! — gritou o garoto armando mais duas flechas metálicas enquanto fugia do mar de infectados que iria inundá-lo em segundos.
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Abby olhou para o muro e viu que as duas flechas metálicas estavam cravadas a pouco espaço de distância uma da outra e, em seguida, mais duas foram cravadas no muro formando uma espécie de caminho, escada, apoio, uma maneira que pudessem escalar o muro as usando. Por puro instinto, Abby já estava subindo o muro. Por serem flechas metálicas, cravaram fundo no muro e aguentaram o peso de Abby e Ellie juntas e em poucos segundos estavam no teto de uma casa.
Lev pulou nas flechas logo em seguida. Os infectados vieram com tanta velocidade que se espatifaram no muro e foram esmagados pela quantidade horrenda de mortos vivos que se aglomerava sedenta por um pedacinho de Lev, que por pouco não perdera suas pernas se não tivesse as encolhido rapidamente. O garoto subiu mais uma flecha desesperado enquanto chutava a cara dos monstros que tentavam abocanhá-lo e, de repente, sentiu uma mão grossa pegar sua aljava e o puxar como se fosse um boneco de pano. Abby havia colocado Lev no topo da casa.
— Estoura as flechas. — gritou Ellie esticando seu revólver para Abby, e assim, a mulherona atirou nas duas flechas mais próximas, arrebentando-as e impedindo que os infectados escalassem até a casa. Por fim, devolveu o revólver à Ellie.
Lev deitou no teto, exaurido. Era claro que o garoto havia chegado em seus limites. Suava demais enquanto sua respiração extremamente ofegante preocupava Abby, que também sentia seu corpo todo arder como se tivesse feito seu treino de academia da semana em apenas alguns minutos.
— Ellie, como é que você tá? — perguntou Abby que não conseguia enxergar a garota a não ser por vultos de seu cabelo e por seus braços que de vez em quando apareciam para atirar nos infectados enquanto fugiam.
— Bem... — mentiu Ellie. Já se sentia humilhada demais por estar sendo carregada nessa fuga tão intensa.
Seu corpo formigava por inteiro, talvez pelo sangue preso por conta dos lençóis que a amarravam a Abby, talvez pelo veneno ainda em seu corpo. Suas feridas de bala e das agulhas da tortura doíam em apontadas, como se o tempo todo tivesse alguém enfiando o dedo em cada um dos ferimentos. Sua cabeça latejava em enxaqueca enquanto seus sentidos, apesar de melhores do que quando resgatada, ainda estavam meio embaralhados, não sabendo se às vezes via o que via ou realmente ouvia o que ouvia. Como uma pane no sistema dando comandos aleatórios e errôneos, sua mente pregava peças com ilusões e distorções da realidade ora ou outra. Mas jamais admitiria a Abby que estava nesse estado tão crítico, na verdade, era impressionante só o fato de Ellie ainda estar acordada conseguindo guiar o caminho e atirando em infectados.
Abby abriu a mochila que usava do lado da frente de seu corpo, pegou um cantil d’água e jogou para Lev.
— Se recomponha. Você está sendo fenomenal, Lev, devemos nossas vidas a você. Estou orgulhosa do homem incrível que você se tornou — elogiou Abby, vendo o garoto corar sem conseguir responder, pois estava ocupado demais se inundando de goles profundos de água.
— Ali, a antena de rádio que eu falei — apontou Ellie para uma enorme antena de rádio que estava em cima de uma construção à beira da grande cratera de fogo e entulhos que a explosão causara. A antena devia ter uns quarenta metros de altura e estava em um ângulo de setenta graus, provavelmente abalada pela explosão e pelo edifício que, apesar de quase intacto comparado ao estrago à sua volta, ainda assim apresentava muitas rachaduras e buracos no concreto ali e aqui.
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— Está bem próximo, uns vinte metros daqui. — Abby andou até a beira do teto da casa em que estavam para avaliar o caminho que fariam, mas sua alegria de ver a antena tão perto se esvaiu rapidamente ao ver que as ruas em volta deles estavam cheias de infectados. Não dava para descer do teto, estavam ilhados por centenas de mortos vivos ansiosos pelo jantar — Droga... tem que ter um jeito da gente chegar lá.
— Abby... — Lev se esforçava para avisar a garota do perigo que se aproximava. O muro que haviam acabado de escalar revelava algumas mãos se aproximando do telhado em que estavam. Abby olhou ao redor e achou alguns galhos quebrados caídos nas telhas, pegou um deles e correu em direção ao muro.
Realmente, o tiro nas flechas impediu que os infectados escalassem àquela hora, mas, então, usavam uns aos outros como apoio para chegar até o teto. Eram tantos infectados que pisoteavam-se, subiam em seus ombros, esmagavam os de baixo com selvageria, tudo para conseguirem alcançar o topo, e estava dando certo. Abby usou o galho para bater nos que se aproximavam e ganhar um pouco de tempo, mas suas ideias haviam se esgotado. Não aguentava mais carregar Ellie, não aguentava mais ver Lev em seu limite, não aguentava mais fingir que estava tudo bem e que ela tinha esperanças, pois o mundo ao redor a mostrava que a morte deles era inevitável. Porém estavam tão próximos, a antena estava logo ali, haviam batalhado muito... Abby pensava revoltada e entristecida enquanto acertava infectado atrás de infectado com o galho. Colocava sua frustração para fora com tanta intensidade, que o galho quebrou no meio ao estourar a cabeça de um corredor.
— Abby... O garoto — avisou Ellie. Abby se virou e viu Lev em cima da chaminé, com uma flecha cravada no concreto, a corda que havia pego no quarto de Ellie com uma ponta amarrada na flecha da chaminé e outra na flecha que esticava em seu arco mirando em direção ao edifício da antena de rádio. Atirou!
A flecha percorreu o céu e atingiu a parede do edifício do lado onde se encontrava um quintal. O local perfeito. O quintal era protegido por uma mureta alta, então estava livre de infectados e havia uma porta que dava acesso ao edifício. Tudo que precisavam era usar a corda como uma tirolesa para acessar o lugar.
Abby correu até a chaminé, Lev estava sentado no topo ainda retomando o fôlego.
— Me desamarra — disse Ellie com a voz fraca. — A flecha, mesmo de metal, não vai aguentar nós duas e podemos usar os lençóis pra escorregar até a estação de rádio.
— Você consegue deslizar sozinha? — perguntou Abby não confiando no estado de Ellie.
— QUÊ?! Tá me tirando, né? Eu não espanquei você o suficiente pra você saber que eu dou conta de uma tirolesinha? — Ellie odiava ver Abby se preocupando com o bem-estar dela. — Vai logo, não aguento mais ficar sentindo esse seu cheiro de macaca molhada.
Abby cerrou os punhos e sentiu seu sangue ferver. Pegou sua faca e rasgou o lençol de sua cintura ainda em pé. As amarras se soltaram e Ellie sentiu seu apoio sumir sem aviso prévio, caiu com tudo batendo a bunda no chão e sentindo seu corpo gritar como se todos seus ferimentos a xingassem pelo impacto.
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— Quenga mal-agradecida. — Abby a ofendeu jogando o lençol na cara de Ellie. — Você precisa dela viva, Abby, foco na missão... — cochichou para si mesma enquanto escalava a chaminé. Chegou perto de Lev e o abraçou com força. O garoto não entendeu o afeto repentino e ficou desconcertado. — Obrigado, Lev. Não sei o que seria de mim sem você. — E beijou sua testa.
Lev não sabia como reagir. Nunca teve muito afeto de sua mãe ou de seus amigos Serafitas. Yara o amava demais, mas não era muito de abraços e beijos.
— Você já me salvou tantas vezes, Abby... Tava na hora de eu retribuir um pouco — respondeu Lev, desviando o olhar envergonhado.
— Você não precisa retribuir nada, garoto... Mas, mesmo assim, você já retribui todos os dias estando ao meu lado.
— Gente... É melhor apressarmos essa tirolesa — alertou Ellie apontando para os corredores que começavam a acessar o telhado em que estavam. — Eu dou cobertura, vão! — Sacou seu revólver e começou a atirar.
— Você primeiro. — disse Abby dando um pedaço de lençol para o garoto que, sem hesitar, usou a corda como tirolesa e chegou ao outro lado em poucos segundos. — Ellie, sua vez!
— Vai logo, eu seguro esses aq... — Antes que pudesse terminar, sentiu-se sendo puxada para o topo da chaminé.
— Cacete de garota teimosa, não discute porra! — Abby pegou o revólver da mão de Ellie e a deu espaço para usar a tirolesa.
Ellie ficou emputecida com a audácia de Abby, mas lembrou-se, sabe-se lá porque, do dia em que ela e Joel foram para o museu e Ellie contava que vivia na diretoria da escola por ficar discutindo com uma amiga que chamava os Vagalumes de terroristas. Joel havia dito: “Olha, você precisa parar de deixar os outros te tirarem do sério.” A nostalgia foi gostosa e baixou, mesmo que por poucos segundos, a tensão do momento perigoso que estava. O veneno de Víbora foi horrível, mas, por outro lado, a fazia se lembrar de momentos felizes que ela mesmo já havia se esquecido.
Então, Ellie protagonizou um momento raro em sua vida que foi engolir seu orgulho e não discutir com Abby. Ela pegou o lençol, amarrou bem em seus braços e desceu a tirolesa. Abby fez o mesmo poucos segundos depois.
Todos estavam finalmente na estação de rádio. O quintal em que aterrissaram parecia um lugar de descanso de trabalho, algumas cadeirinhas coloridas, uma mesa com um cinzeiro e um baralho em cima e algumas plantas e flores no canteiro. À frente, uma porta de vidro fechada que dava acesso ao estabelecimento.
— Estão todos bem? — perguntou Abby devolvendo o revólver para Ellie.
Lev fez um joia com a mão, havia recuperado seu fôlego, apesar de ainda parecer bem cansado. Ellie estava sentada no chão, mas ao ser questionada por Abby, ela concordou com a cabeça e se levantou. Apesar de tudo que havia sofrido, ela ainda conseguia continuar, era realmente impressionante. Lev se aproximou dela e deu seu cantil com água, Ellie aceitou como se aquilo fosse o melhor presente que já tivesse ganhado, mas tentou disfarçar sua empolgação para Abby.
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— Beleza, a gente tá no térreo, esse lugar tem dois andares e o terraço onde precisamos chegar pra escalar a antena e ter uma ideia de por onde seguiremos. Mas tomem cuidado, pois não sabemos se tem infectados dentro deste lugar. — Abby tomou a dianteira e passava as instruções para a equipe. Ellie odiava obedecer Abby, mas lhe restava pouca energia para brigar, então resolveu poupá-la para gastar nos infectados em vez de em Abby.
— Me restam três flechas de madeira — disse Lev cabisbaixo.
— Droga... eu só tenho 17 balas de MP5. Isso dá pra uma rajada de tiros e olhe lá — completou Abby.
— Eu tenho um pente estendido com 20 balas — afirmou Ellie o colocando na arma e devolvendo o cantil para Abby, que colocara no bolso da calça. — Vamos ter que fazer as balas valerem a pena.
— Vamos entrar sorrateiros. A gente mata os demônios que acharmos por trás, economizamos munições e evitamos barulho. Se os demônios lá de fora souberem que estamos aqui, não haverá porta que segure eles. — Lev estava certíssimo, teriam que tomar muito cuidado.
— Beleza, eu vou na frente. — Abby sacara sua faca e observara através da porta de vidro tentando enxergar algum sinal de movimento. Nada.
Abriu a porta e entrou sorrateira seguida por Ellie e Lev. O local estava quieto, bem quieto, mas havia marcas de batalha por todo o lugar. Corpos de infectados mortos no chão, cantos da parede e em cima de alguns móveis. Da mesma forma era possível ver vários Cascavéis dilacerados e comidos. Ocorrera uma batalha intensa naquele lugar, aparentemente, sem vencedor.
— Fiquem espertos, pode ter sobrevivido algum deles. — Ellie observava a cena procurando algum sinal dos sobreviventes de Jackson que Abby falou que libertou, mas, até então, sem sucesso.
— Cascavel ou Demônio? — perguntou Lev.
— E faz diferença? — completou Ellie.
O lugar estava uma bagunça, sangue para todo o lado, móveis arrastados, uma barricada frágil e improvisada na porta, como se os Cascavéis não tivessem tido tempo para barricar melhor, e logo imaginaram o porquê. Uma janela quebrada e tampada por uma prateleira que deixava uma frestinha da janela à mostra, com dois braços de corredores tentando se esgueirar para entrar, mas sem sucesso.
— Procurem munição nos corpos — aconselhou Abby, se aproximando de um cadáver.
Ellie chegou perto de uma mulher com longos cabelos negros e uma MP5 que estava caída próxima à escada do andar de cima, esticou a mão para pegar a arma, mas foi surpreendida quando sentiu seu pulso ser segurado pela mulher supostamente morta.
— Me... ajuda... F... V... — A mulher se esforçava, estava com um ferimento de bala no peito, algo que Ellie se questionou. Por que uma Cascavel estava morrendo por ferimento de bala em uma batalha com infectados? O machucado a fez perder bastante sangue, mas não parecia ser fatal, era possível que sobrevivesse caso estancasse o sangramento. Ellie chegou perto da moça e disse:
— Por que eu ajudaria uma Cascavel que destruiu minha cidade? — Puxou a faca e cortou a garganta da mulher devagar.
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— Ellie...?! — Lev viu o assassinato sádico de Ellie.
— Ela foi mordida, eu fiz um favor pra ela. — Limpou o sangue da faca no corpo da moça e pegou o pente da MP5. Devia ter umas 10 balas, uma rajada a mais de tiro para Abby. — Ei, aqui! — Jogou o pente para Abby, que agradeceu.
Ficaram alguns minutos buscando por suprimentos no local. Fora a mulher que Ellie finalizou e outros dois infectados que se rastejavam até Abby os matar, todos os outros estavam mortos. Infelizmente, não havia muitos espólios a se adquirir. As armas estavam todas com munição irrisória, não valia a pena carregar o peso de uma nova arma por conta de três ou quatro balas no pente. Também não havia mais balas de MP5 ou revólver, muito menos flechas. Isso não animou nada os três que continuavam procurando. Por fim, acharam pelo menos uma garrafa de álcool, pedaços de trapo, e alguns lanchinhos na cafeteria da recepção. Uma pausa rápida para respirar e botar um pouco de alimento para dentro já ajudou os três a recuperarem parte das energias, mas não podiam continuar ali, infectados ou outros Cascavéis poderiam chegar a qualquer momento, precisavam descobrir alguma forma de sair, achar um caminho que pudessem seguir, um lugar seguro, uma fuga daquela desgraça toda.
Então, voltaram às suas jornadas e subiram as escadas para o andar de cima. Uma porta bloqueava o caminho, tentaram abri-la, mas estava trancada. Talvez por isso os Cascavéis morreram no térreo, não tendo por onde escapar. Porém Abby sabia arrombar portas com sua faca. Relutou um pouco, já tinham pouquíssima munição, não queria quebrar sua faca arrombando a porta, porém não tinham outra opção, aquele era o único caminho, e não queriam arriscar um tiro para não atiçar os infectados de fora a entrarem. Enfim, quebrou sua faca e abriu a porta.
O segundo andar era bem diferente do primeiro. Não havia sinais de luta, estava tudo bem organizado, um pouco abafado pelas janelas fechadas e escuro por conta das cortinas. Ellie tentou acender a luz, mas apenas duas das lâmpadas funcionaram. Sua luz oscilava como se estivessem tendo problemas elétricos e praticamente não iluminavam nada. Bom, com a explosão e toda destruição, é muita sorte que ainda tivesse um pouco de energia no local.
Várias cabines de gravação, aparelhos eletrônicos com diversos botões, microfones e fios espalhados, tudo em meio a dezenas de mesas em cubículos separadas por finas camadas de paredes de drywall que davam privacidade para a área de trabalho de cada um, clássicas baias de trabalho. Em alguns desses cubículos, havia canecas sujas de café, porta-retratos com fotos de familiares, post-its coloridos, computadores e mais aparelhos eletrônicos específicos do trabalho na rádio.
Apesar de toda organização, havia um único canto que destoava do resto. Umas duas baias próximas estavam completamente devastadas. O computador quebrado como se tivesse sido atingido por um porrete, a mesa vazia e os objetos espalhados no chão como se tivessem sido derrubados, a fina parede que separava a visão das outras baias estava com buracos e rachaduras como se tivesse sido quebrada a murros. Parecia que algum dos trabalhadores tinha se cansado do serviço e tido um burnout, destroçando seu espaço de trabalho.
Ainda assim, tudo estava muito tranquilo e silencioso. Mesmo com essa aparente sensação de segurança, os três andavam cautelosos e vasculhavam cada canto para não serem surpreendidos.
Ellie se aproximou de uma baia, apertou alguns botões para ligar o aparelho e colocou um dos fones de ouvido.
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— O que você tá fazendo? — Abby se aproximou.
— Vendo se tem algum sobrevivente nas bases próximas daqui — respondeu Ellie testando algumas numerações no aparelho.
Lev continuou vasculhando o local.
— E se tiver Cascavéis nessas bases? — advertiu Abby.
Ellie hesitou, dobrou seus dedos por um momento, mas voltou a testar as numerações:
— E se tiver sobreviventes de Jackson?
— Não acho que tenha dado tempo dos sobreviventes terem fugido e já chegado em alguma dessas bases — insistiu Abby.
Lev começou a subir a escada para o terraço, onde se encontrava a antena que daria uma visão mais ampla da cidade.
Ellie fechou os olhos em tristeza, não queria concordar com Abby, mas realmente as bases não ficavam tão próximas para eles já terem chegado.
— Mas podem ter outros sobreviventes, habitantes de Jackson que estavam nas bases quando a cidade foi atacada pelos Cascavéis. — Ellie emitia um sinal de SOS uma base por vez, esperando que alguém respondesse.
— Você tá mandando um SOS? Espera, Ellie, se os Cascavéis também tiverem tomado as bases, você vai tá atraindo mais deles pra cá. — Abby segurou o braço de Ellie impedindo-a de apertar os botões.
Lev acabara de chegar à porta dupla do terraço, parecia estar fechada, mas tinha uma frestinha aberta. A maçaneta tinha uma pequena mancha molhada de vermelho. Sangue? Lev abriu a porta devagar e saiu atento para fora, procurando algum sinal de vida, mas escutou um barulho de batida vindo da direção de Ellie e Abby e se virou bruscamente para encará-las. Ellie havia se libertado da mão de Abby e socara com força a mesa.
— Mas se forem sobreviventes de Jackson, estaremos chamando reforços. Eu preciso saber se sobrou mais alguém!
“Bip... Bip...” e seguiu-se um som de chiado. Uma resposta! Ellie e Abby olharam atentas para o aparelho esperando escutar quem responderia do outro lado. Um som estranho de impacto veio da direção de Lev, seguido de um fechar de porta.
— Lev?! — perguntou Abby colocando a mão em sua MP5, se preparando para sacá-la.
Escutaram passos descendo as escadas, viram botas marrons seguidas de uma calça militar. Algo foi jogado na direção delas, algo do tamanho de uma bola de baseball soltando um rastro de fumaça. Abby e Ellie tomaram cobertura e tentaram olhar em direção a escada. Viram um sorriso sádico segundos antes da explosão de fumaça que tomou conta de todo o andar.
— VÍBORAAAA!
——— Continua ———
Demorooou mais saiu! E aí galera, fala aí, depois de um capítulo desse eu mereço uma curtida e um comentário seu, vai. Diz aí o que vocês acharam dessa fuga intensa e o que vocês acham que vai acontecer com eles nesse encontro com a temível Víbora. Finalmente chegamos nos capítulos finais! Se você ta curtindo toda essa jornada, por favor, compartilhe no face, insta, twitter ou qualquer outra mídia social. Ajudem essa obra alcançar mais pessoas pra que em um futuro possamos dar vida a ela. Obrigado de coração.
Jeová Eterno! Menino! Que capítulo foi esse hein?! Eu jurava que Lev ia se lascar KKKKKKKKKK
Meu irmão! Que massa foi esse capítulo.
Quando saí o próximo?
Faltam quantos até o fim da obra?
Já compartilhei ❤️